[Novel] Heavy Sweetness: Ash-Like Frost - Capítulo 1.1
Capítulo 1: Primeiro Encontro em Shui Jing
As flores desabrocham e a janela está aberta, ainda assim por que não posso te ver?
E quando posso te ver, e te ouvir, por que não posso te amar?
Existe uma próxima vida?
Se assim for, desejo ser uma borboleta,
Ou uma gota de tinta passando por um fino papel,
Ou um grão de areia carregado pelo vento.
Eu esfrego a pálida barreira azul. Estava tão elástica quanto sempre - mais escorregadia até do que uma uva -mas por mais que eu tentasse, eu não conseguia quebrá-la nem com uma faca nem com fogo. Ouvi dizer que a barreira foi feita pela antiga Deusa Floral, mas o meu único pensamento é: esse material não seria mais belo - e prático, por sinal - em um vestido?
“Ah, essa não é a minha pequena pêssego[1]? Há quanto tempo. Como você está?” o Sr Hu[2] cresceu subitamente do chão e pôs-se na minha frente.
Pressionei minha mão em meu coração, permitindo-o se acalmar do choque, então toquei o homem-criança no lado de sua cabeça, lembrando-o: “Nós acabamos de nos ver essa manhã.”
Os pequenos olhos do Sr Hu brilharam maliciosamente. Rugas cobriram suas faces enquanto ele lamentava, “Você está tirando sarro da minha idade, do fato de que eu não tenho uma memória tão boa quanto costumava ter?”
“É.” Eu concordei sinceramente.
“Minha pequena pêssego está tão maldosa quanto sempre. Estou satisfeito, tão satisfeito.” O pequeno velho homem sacudiu a cabeça. “Mas agora, aonde você estava indo?”
“Eu ouvi que a Chefe Floral está desocupada, então eu queria procurá-la e pedir sua permissão para ver o mundo fora do Reino Floral. Ouvi que é muito interessante.”
“Pequeno Pêssego, você quer pedir para a Chefe Floral deixar você sair do Reino Floral?” exclamou o Sr Hu, chocado.
Considerando que estive encarando o mar de flores fora do da barreira de água, esperando além da esperança que uma fada passasse e me ajudasse a enviar minha mensagem para a Chefe Floral, achei as reclamações do Sr Hu um pouco enviesadas.
Ele suspirou teatralmente, “Qual o seu problema? O que tem de tão bom do lado de fora? Lá é cheio de perigos, cheio de perigos! Fadas de frutas e deuses de frutas como você e eu já são uma raridade -sem dúvidas lá você seria devorada rapidamente!”
O Sr Hu é um deus cenoura; obviamente um vegetal, mas que de algum jeito alega ser uma fruta. Ele tem muito orgulho de seu status de deus, o que, vou admitir, é raro de se conseguir para nós frutas e vegetais. Olhe para mim, por exemplo. Depois de 4.000 anos, eu ainda sou apenas uma fada. Realmente desencorajador.
No Espelho d’água, além do Sr Hu e de mim, só existem umas poucas outras fadas que nunca parecem progredir. Nós somos protegidos pela forte barreira erguida pela antiga Deusa Floral, cuja a qual bloqueia todos os intrusos.
Mas isso não faz muito sentido para mim. Pegue uma porta como exemplo: você precisa ser capaz de empurrar ou puxar a porta para que pelo menos abra para um lado. Se ela simplesmente não abre, então não passa de um muro. E a barreira é só isso mesmo - um muro que bloqueia não só a entrada de intrusos, mas também, incompreensivelmente, nos impede de sair.
A Chefe Floral vem nos visitar aqui uma vez ao ano, tempo durante o qual ela confere os nossos estudos para ver se progredimos em nossa magia. Toda a vez que ela testa a minha magia, ela sempre faz uma expressão de desesperança. Ela me disse que eu não posso sair enquanto não houver aprendido o suficiente para me proteger, talvez por volta do meu aniversário de 10.000 anos.
Mas eu realmente não tenho paciência para esperar outros 6.000 anos.
“Você nunca teve essa experiência, então você não sabe,” continuou o Sr Hu , “mas o lado de fora é realmente aterrorizante. Quando eu ainda era jovem, eu por acaso encontrei um coelho com olhos vermelho-sangue que tentou me morder com seus grandes e robustos dentes. Se eu não tivesse cavado buracos suficientes, eu não teria sido capaz de escapar em tempo e teria certamente sido feito em pedaços. Olhe aqui, essa é a cicatriz que o coelho me deixou!”
O Sr Hu subiu sua manga enquanto falava, mas eu não podia dizer se ele estava me mostrando uma cicatriz apagada ou uma grande mancha de Sol. Que pessoa velha não tem algumas sardas? Em qualquer caso, a única coisa que eu aprendi com a história dele foi que coelhos são assustadores.
“Um pêssego como você? Seria devorada na mesma hora!” disse o Sr Hu, estalando seus lábios e esfregando seu estômago.
“Eu sou uma uva, não um pêssego,” eu apontei, sentindo a necessidade de corrigir mesmo que eu estivesse ouvindo apenas parcialmente.
“Uva, pêssego… não são todos iguais? Você não deveria criar tanto caso sobre esse tipo de coisa,” ele respondeu, alisando sua barba e parecendo um pouco embaraçado.
Eu esperei um pouco mais, mas nenhuma fada apareceu do lado de fora da barreira para enviar minha mensagem, e eu decidi voltar no dia seguinte.
****
Quando eu voltei para a minha cabana, o Sol já tinha se posto. Fui recebida pelo cheiro de algo queimado. Ao abrir a porta, uma excitada Lian Qiao se lançou até mim e me mostrou um monte de uma substância negra não identificável.
“Pequena Uva, você voltou! Veja o que eu encontrei no jardim.”
O intenso cheiro emanado da substância me forçou a dar alguns passos para trás. Relutantemente, eu dei uma olhada na coisa e comentei, “É escura, realmente escura!”
Lian Qiao não estava muito impressionada com a minha resposta. “Eu te perguntei o que você acha que é, não de que cor é!”
Lian Qiao é uma fada floral. Ela gosta de pegar lixos aleatórios aqui e ali e jogá-los para mim. A coisa que ela achou hoje não era a maior delas, mas era certamente a que tinha o mais intenso cheiro.
“É só um corvo meio morto”, eu arrisquei, baseada em suas penas negras. “Vamos enterrá-lo no jardim como fertilizante.”
“Corvo?” Lian Qiao guinchou. “Está me dizendo que é um pássaro? Um pássaro! Esse é o primeiro pássaro que eu vejo em toda minha vida!” Ela rodopiou em excitação.
Bem, não se pode culpar a garota. Aqui no Espelho D’Água, não existe nada além de flores, grama e insetos. Nós certamente nunca tivemos um pássaro que voou para dentro. Eu só sabia sobre corvos porque eu li a “Enciclopédia das Formas de Vida nos Seis Reinos” do Sr Hu e tive uma vaga lembrança.
“Meio morto, você diz? Então não está completamente morto? Você acha que podemos salvá-lo? E se o salvarmos, não podemos mantê-lo como um pet?” Lian Qiao implorou, puxando minhas mangas.
Eu olhei para suas mãos enegrecidas, então para minhas pobres mangas, e subitamente me senti grata por estar vestindo uma túnica roxa hoje. Se eu a lavasse um pouco, provavelmente poderia usá-la de novo.
Eu disse a ela, “Mas o que é a vida? E o que é a morte? Vida e morte estão fora do nosso controle. Todas as coisas devem enfrentar o seu destino. Se o corvo estiver destinado a viver, ele viverá mesmo que nós o deixemos sozinho no jardim. Se estiver destinado a morrer, então não poderemos trazê-lo de volta à vida, não importa o quanto nós tentemos.”
“Seja lá o que você acabou de dizer, é totalmente confuso. Tudo o que eu sei é que Buda nos diz para ser gentis. Como você pode deixar algo morrer?”
“Como você sabe que eu estou sendo gentil ao salvá-lo? As vezes, vida é miséria e morte é felicidade.”
Lian Qiao abriu seus lábios, os fechou, e então os abriu novamente. Finalmente, ela disse, “Me deixe pensar sobre isso,” e saiu, perdida em pensamentos.
Eu alegremente levei o corvo para o quintal. Dois anos atrás, eu plantei uma bananeira no jardim, mas ela não cresceu bem. Eu aposto que é por não ter nutrientes suficientes. O corvo pode servir para isso.
Eu o enterrei rapidamente, então me limpei para ir dormir.
No meio da noite, subitamente me ocorreu pensar como o corvo entrou no Espelho D’Água para começo de conversa. Eu acordei com um susto e corri para desenterrá-lo.
Eu estudei as asas do pássaro sob a luz dos vagalumes flutuando em volta de uma videira. Na base de suas asas, eu vi uma camada de ouro.
Bem como pensei, esse não era um corvo comum. Usar um pássaro mágico como fertilizante parecia um desperdício. Melhor cozinhá-lo e dividi-lo entre nós fadas, não? Talvez ajudasse os nossos poderes a crescerem um pouco.
Eu pensei que esse era um plano muito bom. O único problema nele era que o pássaro já havia começado a endurecer e poderia ser difícil de comer. Para evitar que endurecesse mais, eu achei que seria melhor soprar alguma vida nele.
Relutantemente, eu puxei para fora o jarro de mel que eu estava cultivando por quinhentos anos e dei uma gota ao corvo, então lhe passei um pouco do meu qi. As asas do pássaro imediatamente se suavizaram e aqueceram. Agradada comigo mesma, eu fui para a cozinha buscar uma panela.
Quando eu voltei, eu vi que os vagalumes, espantados por alguma coisa, estavam voando pelo cômodo freneticamente. Eu olhei em volta e vi que não era nada demais - os vagalumes eram apenas ignorantes - se tratava apenas do pássaro mágico ter assumido sua forma humana e estava desmaiado na cama.
Eu contornei a cama, panela em mãos, aborrecida. Como esse humano gigante iria caber na minha pequena panela? E se não couber, como eu o cozinho?
Após pensar um pouco, eu de repente me lembrei que todos os seres mágicos tem um neidan, que guarda todo o seu poder mágico. Uma vez que você come o seu neidan, você comeu tudo. E a tola aqui, prestes a cozinhar o pássaro inteiro!
Só que, onde fica o neidan desse pássaro? Eu esquadrinhei suas roupas, o tempo todo maravilhada com esse estranho senso de moda - as roupas dele eram cheias de buracos, mas não conseguia achar o neidan em nenhum lugar. Deve estar escondido no corpo dele. Com algum esforço, eu tirei suas roupas enegrecidas e procurei em seu corpo.
Finalmente, eu descobri algo. Abaixo do estômago do corvo, estava pendurado um objeto de aparência estranha. Eu o apertei - era duro e macio ao mesmo tempo. Eu pensei sobre o meu próprio corpo e não conseguia pensar em nada similar. Então é isso! O neidan dele deve estar aqui. Muito esperto da minha parte, eh?
Eu transformei uma videira em uma faca e a testei em duas mechas do meu próprio cabelo, satisfeita que ela cortou bem por elas.
Pronta para acertar, eu peguei a parte pendurada do corpo do corvo em minhas mãos e estava prestes a descer a faca nele, quando de repente, uma voz retumbante explodiu: “Como se atreve!"
Tradução: Graceful Spring
Notas:
[1] Em chinês "pêssego" e "uva" são homônimos, ambos vem da palavra "tao".
[2] "Hu" se refere a "cenoura".
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